A Utilização Estratégica do Joint Tenancy with Rights of Survivorship e a sua eficiência em planejamento sucessório

O estudo sobre a eficiência sucessória e sobre a sobrevivência das empresas no mercado afetadas por um processo de organização e de sucessão não planejado ou realizado de maneira inadequada, é um dos temas mais importantes em relação à imprescindibilidade de realização de um adequado planejamento empresarial sucessório.

O planejamento sucessório abrange, dentre outras possibilidades, a adoção de um conjunto de estratégias visando a maior eficiência na organização dos ativos em uma sociedade empresária e a perpetuação desta sociedade; mas especialmente trata da sucessão da titularidade da participação societária com eficiência operacional e tributária, focando na melhor governabilidade da sociedade e na proteção em face de terceiros.

Diante do preocupante cenário econômico brasileiro, da atual instabilidade política e se tratando de ano eleitoral no país, a busca por investimentos no exterior se mostra pertinente ao habilitar o acesso a uma maior segurança e proteção do capital, a diversificação de investimentos e a outros mercados mais sólidos e menos voláteis.

É fato que a realização de operações no exterior por meio da constituição de uma sociedade empresária nos Estados Unidos ou em alguma jurisdição Offshore, ou mesmo por meio da pessoa física, não afasta a necessidade e pertinência da elaboração de um planejamento sucessório prévio.

Com efeito, operações – especialmente financeiras ou de investimentos – realizadas no exterior usualmente são concretizadas por meio da constituição de uma sociedade empresária (Ref:1) incorporada no país onde efetivamente se operam os ativos/investimentos (“Onshore”) ou a sociedade pode ser incorporada em alguma jurisdição distinta daquela onde são operados os ativos/investimentos (“Offshore”), neste caso, há preferência para as jurisdições dotadas de tratamentos fiscais mais favoráveis. Tais sociedades incorporadas em Offshores são denominadas de Private Investment Companies (“PIC”).

Independentemente de ser uma jurisdição Onshore ou Offshore, em se tratando de uma operação fora do Brasil, o falecimento do titular de uma participação societária implica em uma série de consequências sucessórias, dentre as quais se destacam: (i) a necessidade de abertura de processo de inventário e partilha no exterior; (ii) a possibilidade de pagamento de imposto sobre a herança (transmissão causa mortis) no exterior; e (iii) a transferência da participação societária do titular para os seus sucessores.

Os dois primeiros pontos acima listados possuem como consequência procedimentos burocráticos e morosos, além disso, necessariamente a sucessão é exposta a consideráveis gastos para suportar os aludidos procedimentos e arcar com a obrigação tributária para a transmissão da herança.

Nesse sentido, em se tratando de ativos localizados nos Estados Unidos (Ref:2), no caso em tela, de ações de uma sociedade empresária norte-americana, o imposto sobre a sucessão para não-residentes fiscais americanos pode facilmente atingir a alíquota máxima de 40% (quarenta por cento), considerando a isenção para bens e direitos de USD$60.000,00 (sessenta mil dólares). Em jurisdições dotadas de tratamento fiscal mais favorável, embora possa não haver a incidência de imposto desta natureza (Ref:3), o procedimento sucessório de bens e direitos é burocrático, moroso e custoso, isto em razão da obrigatoriedade de contratação de especialista local para a instauração e conclusão do processo de sucessão.

No terceiro ponto listado, ocorre a possibilidade do ingresso de terceiros não desejados ao ambiente empresarial, podendo gerar disputas de poder, conflitos de interesse, desentendimentos e até mesmo dissolução societária ou litígio entre os sócios.

Portanto, a utilização de cláusula de Joint Tenancy with Rights of Survivorship (“JTWROS”) no âmbito societário internacional é uma pertinente estratégia de planejamento sucessório, principalmente para afastar o imposto sucessório e a necessidade de procedimento de sucessão (inventário e partilha) no exterior, mas também para “direcionar a transmissão” do bem na falta do seu titular.

A JTWROS refere-se a uma estrutura legal de propriedade em condomínio, envolvendo duas ou mais partes (Ref:4) para qualquer tipo de ativo (p.ex. ações de sociedade empresária). Cada proprietário em Joint Tenancy tem um direito igual ao dado ativo, ou seja, consideram-se todos os proprietários em Joint Tenancy como cotitulares de um mesmo ativo, em condomínio.

Por ocasião dos “rights of survivorship”, os proprietários em Joint Tenancy que sobreviverem ao proprietário falecido são automaticamente considerados proprietários do bem.

A JTWROS, portanto, se traduz no exercício do direito de propriedade pelos “proprietários conjuntos”, de forma indivisível, sobre o bem considerado como um todo. Enquanto vivos, os “proprietários conjuntos são titulares do mesmo direito de propriedade de forma indivisível (cotitularidade). Por ocasião da morte de um, o sobrevivente passa a ser titular desse direito de propriedade isoladamente. Assim sendo, nada resta para ser transmitido, herdado ou fracionado por terceiros.

Nos Estados Unidos, é possível aplicar o instituto (similar) para Corporations (Ref:5), mas não para empresas LLCs ou LPs (Ref:6). Em outras jurisdições dotadas de regime tributário mais favorável, ideais para a incorporação de PICs, como Bahamas, Ilhas Virgens Britânicas (BVI) e Belize, é possível a instituição da cláusula de JTWROS.

O JTWROS é um instituto existente em alguns países regidos sob o regime jurídico anglo-saxão e, portanto, não é aplicável no Brasil (sob o regime romano-germânico), entretanto vigora no país o princípio da pluralidade dos juízos sucessórios, segundo o qual, havendo patrimônio em diferentes países, estes bens deverão ser inventariados em cada uma das jurisdições envolvidas. Ou seja, desde que respeitados os limites impostos, sob o ordenamento jurídico brasileiro, pela ordem pública, bons costumes e soberania nacional – art. 17 da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (“LINDB”) – o Brasil deve respeitar a aplicação e os efeitos das leis estrangeiras.  

Tratando-se de JTWROS instituída sobre participações em offshore em jurisdição de direito anglo-saxão, a lei aplicável no Brasil em caso de sucessão deve ser a própria lei da jurisdição offshore conforme determinado no caput do artigo 8º da LINDB.

Ressalta-se que não cabe a discussão sobre eventual caracterização de doação. Os bens situados no exterior escapam ao processo de inventário e partilha no Brasil, devendo ser respeitada a regra sucessória do último domicílio do falecido; ou, no caso, a regra societária da aplicação da cláusula de JTWROS.

Ainda sobre eventual caracterização de doação, nos casos em que o proprietário em Joint Tenancy não realizar qualquer contribuição financeira ao ativo, ele não precisa apresentá-lo em sua declaração anual de bens e direitos no Brasil. Apenas em função da morte do coproprietário é que o referido ativo passará a integrar o seu rol de bens, isto por ocasião da “sucessão automática” oriunda da cláusula de JTWROS.

A JTWROS mostra ser de fato uma ferramenta útil e eficiente para afastar a abertura de processo sucessório no exterior, e evitar o pagamento de imposto sucessório no exterior. Ao mesmo tempo, assegura a “transmissão” do ativo ao “proprietário em Joint Tenancy”, não havendo a obrigatoriedade de aplicação das normas de transmissão da herança a herdeiros instituídos em lei brasileira.

Em suma, a despeito da eficiência estratégica da utilização da cláusula de Joint Tenancy with Rights of Survivorship como instrumento de planejamento sucessório, infere-se que as diversas particularidades de cada situação precisam ser cuidadosamente estudadas no caso concreto e os efeitos/reflexos tributários possíveis no Brasil precisam ser avaliados com cautela para uma melhor racionalidade na tomada de decisão a este respeito.

Ref:1 – Para que não fujamos do tema proposto, em momento oportuno, escreveremos sobre as vantagens de se realizar as operações no exterior por meio da utilização de uma pessoa jurídica especialmente sediada em uma jurisdição Offshore que possua tratamento fiscal mais favorável.

Ref:2 – U.S. situs property/assets: ações de empresa americana, imóvel, bens tangíveis etc.

Ref:3 – A exemplo das Ilhas Virgens Britânicas (BVI), Bahamas, Belize, Nevis, entre outras.

Ref:4 – Pode ser instituída entre membros de uma mesma família, sucessores entre si, ou entre partes não dotadas de qualquer vínculo, ou seja, que não estão relacionadas de forma consanguínea ou civil entre si.

Ref:5 – Corporação, em tradução livre.

Ref:6 – Limited Liability Companies, ou Sociedade de Responsabilidade Limitada, em tradução livre; e Limited Partnership, ou Parceria Limitada, em tradução livre.